Hordiernamente é comum encontrar editais de concurso público que
exijam dos interessados em ocupar um cargo público conhecimento em
informática, o que é perfeitamente compreensivo já que esta tecnologia,
ou melhor, esta ciência transformou o mundo, trazendo diversas facilidades
para a humanidade. Não podendo a administração pública se fechar aos
avanços tecnológicos, sob pena de não alcançar seu objetivo final: o bem
estar social.
São muitos os benefícios oriundos da ciência da informática para a
administração e administrados. Basta observar o crescente número de serviços
públicos na internet
[1] para se ter noção das vantagens
[2]
trazidas por esta tecnologia.
O que é preocupante, é a forma como este conhecimento em informática vem sendo
cobrado em relação ao software. Vem-se buscando do pretenso funcionário público
o domínio em software específico, como por exemplo: Windows, Word, Excel, etc. Em
vez de se buscar conceitos do gênero do software (Ex: editor de texto ao invés de
MS Word), busca-se atalhos, como se estes programas fossem os únicos existentes
no mercado, como se a ciência da informática fosse estática, imutável.
Esta postura da administração vem causando conflitos entre particulares e o Estado,
merecendo portanto uma análise detalhada dos princípios do direito administrativo,
envolvidos nesta questão.
Software e seus modelos de licenciamento
Antes de adentrarmos no conteúdo jurídico da questão, se faz imprescindível
conhecermos o conceito de software. Software é o meio pelo qual o homem interage com a
máquina, traduzindo comandos humanamente compreensíveis , para a linguagem da
máquina
[3]. Utilizando um conceito mais técnico pode-se afirmar que:
"Um software é uma estrutura lógica, um programa que realiza funções dentro de um
sistema computacional"
[4].
Existem diversos modelos de licenciamento de software, dentre eles dois merecem
destaque: Software Proprietário e Software Livre. O primeiro trata-se de um modelo que
restringe as liberdades do usuário, como por exemplo: limitando a finalidade do mesmo,
o número de cópias que podem ser instaladas, negam acesso ao código fonte
[5] impossibilitando assim, o estudo e a modificação do software. Outra característica que geralmente acompanha o software proprietário é o seu alto custo para o consumidor final.
O segundo modelo, o de software livre, vem para garantir a todos os usuários no mínimo quatro liberdades: A liberdade de executar o software, para qualquer uso; A liberdade de estudar o funcionamento de um programa e a de adaptá-lo às suas necessidades; A liberdade de redistribuir cópias; A liberdade de melhorar o programa e de tornar as modificações públicas de modo que a comunidade inteira se beneficie da melhoria. Também conhecido como software libertário, os softwares livres são comumente distribuídos gratuitamente, apesar de não serem necessariamente grátis
[6].
O matemático e Professor Pedro Rezende
[7] bem percebeu e traduziu a diferença entre estes dois modelos de licenciamento de software:
"No software proprietário, o programador abdica da liberdade de controlar sua obra, em troca de salário e compromisso de sigilo, O distribuidor, fantasiado de 'fabricante', torna-se proprietário de tudo. Desde o código fonte, tido como segredo de negócio, até as cópias executáveis, licenciadas ao usuário sob custódia e regime draconiano. Enquanto no software livre o programador abdica de um dos canais de receita pelo seu trabalho, em troca da preservação do controle dos termos de uso da sua obra. Em contrapartida, se a obra tiver qualidades, agregará eficiência aos empreendimentos em torno dela. Seu valor semiológico, conversível em receita com serviços, será proporcional à magnitude do esforço colaborativo onde se insere. O código fonte é livre sob licença que preserva esta liberdade, enquanto a cópia executável é tida como propriedade do usuário. (...) Só tem a perder com ele (Software Livre) quem consegue galgar posições monopolistas no modelo proprietário. O problema é que a ganância faz muitos acreditarem que serão os eleitos pelo deus mercado, enquanto seguem correndo atrás da cenoura amarrada na ponta da vara que pende das suas carroças digitais, não se importando com os efeitos colaterais de se tratar conhecimento como bem escasso, ao considerarem software como mercadoria."
Notas de Roda Pé
[1] Confira a lista de alguns serviços públicos disponíveis na
internet: Diversos serviços da Receita Federal Receita.222
www.receita.fazenda.gov.br, Delegacia on line
www.ssp.ba.gov.br/, Acompanhamento de processo judicial
www.stf.gov.br,
www.tj.ba.gov.br ,
www.trt05.gov.br, etc, Portal da Transparência - banco de informações, aberto à população, sobre o uso que o Governo Federal faz do dinheiro
que arrecada em impostos
www.portaldatransparencia.gov.br, Certidão Negativa da Justiça Federal
www.trf1.gov.br/, Licitações On Line
www.pge.go.gov.br/licitacao. Todos os links acessados em 28 de maio de 2005.
[2] Infelizmente estes serviços não estão disponíveis para a maior parte da população, que sofre com a exclusão digital.
[3] Linguagem da máquina ( baixo nível ) é o código que o computador executa diretamente. É composta de 0´s e 1´s , também conhecida como linguagem binária.
[4] Oliveira, Thiago Tavares Nunes. Decifra-me ou devoro-te: a essência das patentes de software. monografia defendida pelo autor perante Banca Examinadora ocorrida em 24/01/2005 no auditório 42 do Campus da Federação da Universidade Católica do Salvador (Faculdade de Direito). Disponível em:
Acessado em 28/05/2005.
[5] Código fonte é o conjunto de palavras, humanamente compreensíveis, escritas de forma ordenada, contendo instruções em uma das linguagens de programação existente, de maneira lógica. Após compilado, transforma-se em software, ou seja, programas executáveis, humanamente incompreensíveis ( vide nota 1). Esta nota de roda pé se baseia na Wikipedia
www.wikipedia.org. Acessado em 28/05/2005
[6] Para avançar nos estudos sobre software livre recomendo como leitura básica a Cartilha de Software Livre (
http://twiki.im.ufba.br/bin/view/PSL/CartilhaSL). Acessado em 28/05/2005.
[7] REZENDE, Pedro Antonio Dourado de. SOFTWARE LIVRE - A eucaristia digital. Publicado em 15/06/2004. Disponível em
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=281ENO001. Acessado em 29/05/2005.